domingo, 31 de julho de 2016

O que trouxe dentro de mim - Jaén parte 2 (português)

O que trouxe dentro de mim

Jaén, minha mais nova casa. Como a amo... Jaén é como a cidade dos sonhos. Alguns pensam que é muito pequena e não tem nada de interessante. Vão me perguntar: Por que gosta tanto uma cidade com 116 mil habitantes? Porque é a cidade dos erasmus, (Erasmus é um programa de bolsas para estudantes, existem muitos outros programas, mas, normalmente somos todos conhecidos como erasmus). Jaén é tranquila como a cidade que vivi em minha infância no Brasil, isso já me fez gostar dela de início.
Fazia muito frio... Eu e meu amigo Edgar, fomos os primeiros a chegar, pois faltavam 5 dias pro início das aulas. Quando chegamos não sabíamos onde comer, ainda não tínhamos comprado comida e precisávamos almoçar e jantar fora. Digamos que nos 5 primeiros dias vivemos à base de pão (aquele pão duro enorme que é comum na Europa), queijo, presunto e churros com chocolate. Eu me perguntava “Será mesmo tão pequena que não há restaurantes?”.
Mas, a partir de quando Raísa, nossa outra amiga chegou, ela já tinha um conhecido em Jaén e eles nos levaram pra conhecer uns bares. Foi aí que provamos nossas primeiras tapas. Tapas é um termo que também se usa em Portugal, são aperitivos. A grande diferença na Espanha é que você não paga as tapas, ganha uma por pessoa a cada bebida que pede. Os jiennenses e os erasmus de Jaén têm o costume de andar de bar em bar pedindo bebidas e sobrevivendo de tapas. Os bares onde fomos eram localizados no centro da cidade, que é a parte alta, com o passar do tempo, eu conheci o bairro dos bares e restaurantes, Boulevard... aí sim! E mais, é perto de onde eu morava. Vivi 6 meses e não conheci todos porque são muitos, sempre tinha um novo que alguém recomendava, e quando gostávamos voltávamos. Foi ótimo viver com dois brasileiros, toda noite tínhamos assuntos, Raísa sempre levava amigos para casa. E Edgar sempre tinha programas para a noite.
Terei muito a escrever sobre essa pequenina cidade ainda que, o que há de turismo em Jaén, conheci no primeiro mês, que são a Catedral, que está na lista de espera para ser Patrimônio Mundial da Humanidade, o Castelo, os Banhos Árabes e o Refúgio de Judeus, que foi usado durante a 2ª Guerra Mundial. A primeira visita que fiz foi à Catedral, havia poucas pessoas no grupo, mas entre elas duas brasileiras que vieram a ser minhas companheiras na classe de espanhol para estrangeiros coincidentemente, Taynan e Letícia. Tivemos duas semanas de boas vindas aos estrangeiros, para que nos conhecêssemos. Esses primeiros dias, tentando novas línguas e conhecendo pessoas com culturas, jeitos, aparências tão diferentes são muito empolgantes. Com o tempo, naturalmente as pessoas de cada nacionalidade se aproximaram. O botellón é um encontro na casa de alguém antes das festas de quinta feira que eram grátis nas duas principais casas de festa da cidade. As histórias de botellón ficarão entre nós que estávamos ali. O fato é que não perdíamos um e, depois, toda a comunidade de 450 estudantes estrangeiros aproximadamente se encontrava a partir das 3h da madrugada na Mambo ou na Karma, essa hora começavam as festas.
Entre as coisas que vivi em Jaén posso dizer que vi neve. Sim, eu estava lá nos dois fins de semana que as montanhas ficaram branquinhas! Jaén não é nada úmida, por isso não nevou mais vezes, mas quando chovia, sai de baixo! Uma chuva muito forte e fria. No inverno lembro-me que na hora de deitar a cama parecia fria e quando acordava estava tão quentinha... Por falar em tempo meteorológico, a melhor estação que vivi em Jaén foi primavera, por sorte foi a estação que vivi do início ao fim ali. Quando chega a primavera tudo fica mais alegre e colorido, as árvores se enchem de folhas verdes, podemos tirar as roupas de calor das malas e guardar as de frio pouco a pouco... já podemos começar a planejar viagem para as praias e sempre tomar muito cuidado com o sol, que parece ameno, mas não é. No verão é que começamos a sentir o sol e descobrimos a verdadeira importância da sesta. Fazem 50ºC de dia, e cerca de 25º à noite, escurece às 22h20min e amanhece às 6h30 mais ou menos, é impossível sair na rua entre 14h e 17h, o horário mais quente.
Minhas manhãs e tardes eram a Universidade, maravilhosa, dava vontade de estudar com tanta limpeza, tecnologia, bons professores, salas de aula com aquecimento. No meu curso dava mais vontade ainda, sendo História da Arte muito mais antiga e presente na Europa. Eu tinha prazer de acordar cedo para ir às aulas a pesar de todo o frio e sono que dá de manhã. Depois de três semanas que percebi que teria que pegar firme nos estudos porque as 5 matérias que elegi demandariam bastante tempo de dedicação fora da sala de aula. Mas meu caso é raridade, a maioria dos erasmus não comparecia às aulas, ou não gostavam delas.
Transformei-me, sinto-me madura depois de conhecer outras pessoas, culturas, lugares, tradições, hábitos... Transformamos ideias sobre coisas que parecem simples, mas que fazem grande diferença na nossa vida quando voltamos ao país de origem, como músicas novas, que não gostávamos quando chegamos ali e agora só queremos ouvi-las. Eu que cheguei lá falando que queria só conhecer os lindos lugares e atividades culturais, agora amo as festas e os encontros! Aprendi a me vestir melhor, foi natural, foi só o fato de ver como as pessoas se vestem no dia-a-dia e ver roupas e acessórios bonitos e baratos nas lojas, dava vontade de me vestir daquela forma e mantive o hábito na volta ao Brasil. Aprendi a cozinhar e a levar uma vida menos corrida, sair mais e ouvir muita música. Até gostava de cozinhar, aprendi pratos brasileiros e estrangeiros por necessidade e por contatos que me ensinaram.
Jaén é a cidade dos sonhos por tudo isso, os espanhóis da Andaluzia são muito simpáticos e agradáveis, os erasmus, cada um tem sua personalidade, mas são muito iguais por estarmos todos com intenções muito parecidas, de cabeça aberta para conhecer novos mundos e aceitar as diferenças. Para mim a letra da música do grupo Engenheiros do Havaí resume algumas sensações. “Estamos sós e nenhum de nós/sabe exatamente onde vai parar/mas não precisamos saber pra onde vamos/nós só precisamos ir/não queremos ter o que não temos/nós só queremos viver/sem motivos nem objetivos/estamos vivos e isso é tudo/ é sobretudo a lei/dessa infinita highway”. Ao longo dos 6 meses fizemos amizades para a vida, nos conhecemos em diferentes situações, viajamos muito juntos. A gente criou uma família tão rápido que nem percebemos às vezes o quão fortes essas relações se tornaram... Longe da família e de todos os afetos mais antigos, estávamos juntos na mesma jornada de conhecer o mundo e a vida. Os latinos se aproximaram desde o princípio, para mim os Mexicanos são incríveis, os chilenos, colombianos... Fazíamos nosso arroz com feijão e os mexicanos faziam suas tortillas com guacamole, feijão e muita pimenta...
A cidade pequena é perfeita para ver os amigos. À noite saímos para beber e comer tapas, no fim de semana para ver um filme na casa da amiga vizinha ou ir ao parque fazer um piquenique no Boulevard e, por acaso, descobrir que todos os erasmus tinham tido a mesma ideia... haha... Quando não quer fazer nada disso, também pode viajar para cidades próximas, ou fazer um passeio ecológico até o Castelo ou ir a um parque mais afastado. Ou seja, vemos os amigos sem dificuldade sempre que quisermos.
Já no meu último mês em Jaén, muitos já tinham voltado para seus países ou saído a viajar pela Europa por semanas e não voltariam mais ali antes da minha despedida. Então, entre os poucos que restamos tivemos a chance de fazer novos amigos, pessoas maravilhosas que me perguntei: Por que não nos conhecemos antes? E dessa vez o contato e a amizade não era só com os brasileiros ou com os latinos, mas com italianos, franceses, portugueses, poloneses... Foram duas últimas semanas divertidíssimas, de muita festa e bate papo. Minha despedida não podia ser mais engraçada. Meus companheiros de apto desceram para me ajudar a levar as malas e eu simplesmente os tranquei do lado de fora da casa (a porta se tranca ao fechar). Pior ainda, perdi meu ônibus, tive que voltar, e também fiquei presa do lado de fora, pois já tinha devolvido minhas chaves. Enfim, foram umas horinhas a mais me despedindo da minha cidade querida.
Na volta pra casa, dentro do avião, tudo passa pela cabeça, tudo que vivi e muitos questionamentos: “Como será o reencontro com a família?”, “Farei uma boa viagem?”, “O que vai mudar na minha vida de antes?”, “Quando voltarei a minha nova casa na Espanha?”, “Quando vou rever minha família erasmus?”... e muitos outros.  Hoje eu tenho sempre coisas para compartilhar, está natural, para mim, ver as coisas do Brasil e comparar, tanto coisas boas, como ruins, tenho lembranças maravilhosas de uma fase que nunca vou me esquecer, e muita vontade de viajar mais e mais, porque é uma experiência sensacional!


Foto Rosamarina Q.


Foto Luana Carolina


Rosamarina Quadros da Costa
Estudante de História da Arte

31/07/2016

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